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A obra de Roque Ferreira é ampla e vai se descortinando para o grande público pacientemente desde os anos 70, quando Clara Nunes amplificou seus versos. Em verso, prosa, ensaio e canção, esse baiano de Nazaré das Farinhas, radicado em Brasis plurais e profundos, elegeu diversas vezes o amor como pretexto para amar. Amar sobretudo a língua. Pois que ninguém se engane, se há algo que atravessa toda vasta e diversa obra desse grande autor, é a língua como lugar de encantamento. Aqui, a língua se insinua, se esconde e se revela. A língua ritmada derruba e apruma, entre aliterações e assonâncias, a língua conduz aos chiados, aos zumbidos; é ela quem afeta e afaga. É ela quem enfeitiça e ama.
Certamente o leitor já está familiarizado com inúmeros versos que Roque Ferreira escreveu e, eventualmente cantou, sobre o amor: “O meu amor é passarinheiro / Ele só quer passarinhar” ou “Eu queria que a mão do amor / Um dia trançasse / Os fios do nosso destino / Bordadeira fazendo tricô”. Mas aqui, sem as limitações típicas da canção, Roque pode exercitar outros ritmos, outras sintaxes, outros sabores. Quase sempre breves, as Considerações sobre o amor que o leitor encontrará nessas páginas são peças de licadas de uma leveza que não evita o assombro, de uma singularidade inaugural que não se abstêm de ser ao mesmo tempo velha e ancestral. É verdade que aqui o amor tem dicção aforismática, e em muitos casos ele é sério, árido e solene, mas logo adiante se derrete lânguido, engraçado, imprevisível e natural. “Natural enquanto pássaro”, como sugeriu o próprio poeta. Aqui, o amor vestido de língua, também rima a vida com açúcar, é retórico e é “pidão”. Ele coaxa, puxa, repuxa, mas sobretudo alumbra.
Marcos Ramos